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Moral? Que moral?, por Marcelo Coelho

Operário Sindicalizado

A respeito das séries de saques e violência em Londres, Marcelo Coelho, da Folha de São Paulo, escreveu artigo de começo morno, não proletário o suficiente, mas cuja conclusão foi a mais bela prova de amor à massa trabalhadora que já vi. Reproduzo abaixo.
Numa sociedade desenvolvida, os saques foram chocantes. Não se tratava de pegar leite ou batatas num supermercado. Os desordeiros queriam DVDs, iPads, Blackberrys ou não sei mais o quê.

Teoricamente, isso seria um sinal de "imoralidade". Saques motivados pela fome? Podemos entender. Saques motivados pelo luxo, eis algo inadmissível. Será? Toda a estrutura de nossa sociedade afirma que sem um tênis Nike, um iPad ou uma camiseta de grife você não é nada.

Esses badulaques se tornaram, assim, artigos de primeira necessidade. O saqueador alcança, rapidamente e sem punição à vista, o passaporte que o levará a conquistar as mulheres mais bonitas e o respeito dos seus pares. É mais do que simplesmente alimentar-se e sobreviver. Trata-se de existir.

Ao mesmo tempo, o saque é ambíguo. Representa, em doses iguais, revolta e adesão. Destruo aquilo que eu desejo. Arrebento a vitrine que me separa do paraíso, mas também escolho, definitivamente, o caminho da danação. Na violência dessas desordens, vejo ao mesmo tempo denúncia e cumplicidade. Sabemos perfeitamente que uma grife não significa coisa nenhuma. Sabemos que todo o consumo contemporâneo está montado numa mentira.

A mentira da propaganda se duplica em outras mentiras, em incontáveis mentiras. Uma agência de risco mente quando eleva ou rebaixa o risco de um país. Um país mente quando imprime moedas ou títulos da dívida que, promete, vai pagar. O consumidor mente quando usa um cartão de crédito cujas mensalidades não sabe bem como ficarão. Na própria palavra (cartão de crédito), pode-se ler "acreditar".

O consumidor acredita, por sua vez, que é escolha sua um produto cientificamente elaborado para suscitar os seus desejos. Você sabia que até o cheiro de carro novo é produzido por um "spray"? É o que leio num livro recente de Martin Lindstrom, guru dinamarquês do marketing e do "branding". Chama-se "A Lógica do Consumo" (editora Nova Fronteira).

Eles estão usando técnicas da neurociência para chegar mais perto da mentalidade dos consumidores. Adeus, pesquisas de opinião. Os técnicos da propaganda e do marketing medem diretamente a sua atividade cerebral. E, mesmo que aparentemente você não goste de um produto ou de um programa de TV, eles identificam o prazer que produziram no seu cerebelo.

Cheiros, sons e cores ajudam a atrair você a entrar numa butique. Mesmo proibindo propaganda de cigarro, os consumidores de Marlboro aumentam quando se usa cientificamente a cor vermelha. Vá falar em moral e disciplina numa sociedade dessas.

Comentários

  1. Professor de História23:10

    Marcelo Coelho fala nada mais do que a absoluta verdade. Sem dúvida, seu artigo é digno de ser publicado no Jornal Opinião Popular, bastião da revolução proletária e democrática. O consumidor, que é proletariado, que é o povo, é só uma vítima passiva da sociedade consumista burguesa. Sendo o povo também, obviamente, a sociedade, conclui-se diretamente que a sociedade é vítima dela mesma. Somente nós, os arautos do Fim da História, munidos da ideologia superior dos mestres Marx, Engels, Lenin e Stalin podemos abrir os olhos do povo, revelando o triunfo absoluto e inevitável de uma sociedade sem classes, sem conflitos, sem propriedade e sem consumo.

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